Quando eu paro e recordo o meu passado No Sertão, no meu tempo de menino Dentro do peito um certo desatino Toma conta d'um coração alado Que de tanto com o mundo ter sonhado E aspirado um sucesso no futuro Desligou-se d'um modo prematuro Do Sertão, do seu lugar querido E a lembrança de tudo lá vivido Me derruba, e esse golpe é sempre duro. Jakson Amorim ( autor, poeta e colaborador do Blog)
sábado, 28 de maio de 2011
Fim de Feira
o lixo atapeta o chão
um caminhão se balança
quem vem de fora se lança
em cima do caminhão
um ébrio esmurra o balcão
no botequim da esquina
o gari faz a faxina
um cego ensaca a sanfona
e um vendedor dobra a lona
depois que a feira termina.
miçanga, fruta, verdura,
milho feijão e farinha,
bode, suíno, galinha,
miudeza, rapadura.
é esta a imagem pura
de uma feira nordestina
que começa pequenina,
dez horas não cabe o povo.
e só diminui de novo
depois que a feira termina
na matriz que nunca fecha
muito apressado entra alguém
mas sai vexado também
se não o carro lhe deixa
o padre gordo se queixa
do calor que lhe domina
e agita tanto a batina
quem que vê fica com pena
toca o sino pra novena
depois que a feira termina.
a filhinha do mendigo
sentada a seus pés, num beco,
comendo um pão doce seco
diz: papai, coma comigo.
e o velho pensa consigo
meu deus, mudai sua sina
pra que minha pequenina
não sofra o que eu sofro agora
ria a filha, o velho chora
depois que a feira termina.
um pedinte se levanta
da beira de uma calçada
chupando uma manga espada
pra servir de almoço e janta
um boi de carro se espanta
se o motorista buzina
um velho fecha a cantina
um cachorro arrasta um osso
e o pobre “assavessa” o bolso
depois qua a feira termina
um camponês se engana
chega atrasado na feira
não compra mais macaxeira,
nem batata, nem banana
empurra a cara na cana
pra esquecer a ruína,
arroz, feijão, margarina,
açúcar, óleo, salada,
regressa e não leva nada
depois que a feira termina
no açougue da cidade
das cinco e meia em diante
não tem um pé de marchante
mas mosca tem com vontade
um faxineiro abre a grade
tira uma mangueira fina
rodo, pano, creolina,
deixa tudo uma beleza
mas só começa a limpeza
depois que a feira termina
e o dono da miudeza
já tendo fechado a mala
escuta o rapaz que fala
do outro lado da mesa:
- meu senhor, por gentileza,
o senhor tem brilhantina?
ele diz com voz ferina:
- aqui na mala ainda tem
mas eu não vendo a ninguém
depois que a feira termina
um jumento estropiado,
magro que só a desgraça,
quando vê que a feira passa
vai pra frente do mercado
o endereço ao danado
eu não sei quem diabo ensina
eu só sei que baixa a crina
entre as cinco e as cinco e meia
lancha, almoço, janta e ceia
depois que a feira termina.
Dedé Monteiro
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